17/08/2010

EM SERRA TALHADA AS MOTOS JÁ SOMAM A MAIOR FROTA DO SERÃO PERNAMBUCANO E QUASE APOSENTAM JEGUES

Em vez de quatro patas, duas rodas. Já chamado de "volkswagen do sertanejo", o jumento começa a dividir a paisagem do semiárido com o colorido reluzente das motos que levantam a poeira no meio da caatinga

São tantas que já superam até o número de automóveis no agreste e nos sertões: 23.221 motocicletas foram licenciadas pelo Detran no primeiro semestre deste ano contra 12.502 carros naquelas regiões, a grande maioria destes concentrada em áreas urbanas. Em Serra Talhada (PE), a 418 quilômetros de Recife, elas já somam 10.739, para uma população de 85 mil habitantes. Isso sem falar nas menores, conhecidas por "cinquentinhas", que não exigem documentação dos órgãos oficiais.

É a maior frota de motos do sertão pernambucano e a décima segunda do estado. No interior, elas vêm ocupando cada vez mais o espaço antes dominado pelos jegues. Resultado: sem serventia, os bichos começaram a se espalhar e viraram mais um problema de trânsito para o poder público. Eles penam pelas cidades e pelo asfalto das rodovias federais que cortam o semiárido. Não há estatísticas que comparem o antigo com o novo meio de transporte.

Mas uma contagem feita pelo GLOBO, ao longo dos 256 quilômetros que separam o município de São Caetano (ainda no agreste) ao de Serra Talhada (no sertão), mostrou a prevalência das motos: 65 no percurso, contra 31 jumentos conduzidos nos acostamentos pelos donos. Outros 42 foram observados soltos ao longo da BR-232, oferecendo risco para os motoristas.Três outros mortos por acidente foram encontrados no mesmo caminho.

O problema está se agravando tanto que nos quadros da prefeitura de Serra Talhada já consta um cargo curioso entre os servidores do poder público: o de laçador. E ele é tão necessário hoje que, no próximo concurso da prefeitura para o preenchimento de 400 vagas, há seis para laçadores, aqueles peões que laçam o gado com a corda. No caso de Serra Talhada, laçam os jumentos.

"A lei exige concurso, e vamos fazê-lo. Não sei os critérios que a empresa encarregada usará para contratar os laçadores, que são homens do mato, normalmente analfabetos", diz o prefeito Carlos Evandro (PR), de Serra Talhada, onde as pessoas que não sabem ler na área rural ultrapassam 70% da população.

Natural da cidade, Evandro acompanhou a mudança no principal meio de transporte que, segundo ele, foi radical nos últimos cinco anos. "Jegue nessa terra antes era ouro de lei. Hoje tem de monte "bamburrando" (circulando em quantidade) por aí e ninguém quer, porque todo mundo só anda de moto. Por semana, 50 pessoas acidentadas."

A prefeitura tem outro motivo para preocupação: o excesso de motos circulando na cidade, das quais cerca de mil pertencem a mototaxistas, muitos clandestinos. Chefe da 6 Delegacia da 11 Superintendência da PRF - com jurisdição em dez municípios - o inspetor João Ernande de Bezerra está querendo contratar 25 guardas de trânsito para disciplinar os motociclistas que circulam na cidade. Da mesma forma que fez com os 150 carroceiros (puxados a cavalo ou jumento) que trabalham no Centro, carregando frete. Todos cadastrados na prefeitura.

"As carroças e os jumentos dão menos trabalho. Ninguém morre em acidente de carroça. Mas desastres com motos são diários. A quantidade de motos explodiu, mas falta fiscalização. Quando começar a doer (com multas) nos bolsos, os motoqueiros vão se disciplinar", diz Evandro.
Fonte: O Globo
Revista Mundo Moto

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